Eu não sou bom mesmo em cumprir promessas. Já desencanei da porra do regime e estou gordinho novamente. E eu havia prometido intimamente não falar dos tais jogos panamericanos, mas cá estou eu descumprindo mais uma das minhas resoluções.
Por que eu não queria falar do "pan"? Óbvio, né? Porque não é um torneio importante e serve para os ufanistas de plantão inflarem o peito e gritarem sem parar: é ouro!, é ouro!, é ouro!, como se o Brasil fosse de fato uma potência olímpica.
Teve um panamericano aí, sei lá qual, em que o Brasil havia conquistado sei lá quantas medalhas de ouro e, a Folha de S. Paulo, que é boa em encher o saco, tanto para o bem quanto para o mal, fez um levantamento para saber quantas daquelas medalhas de ouro seriam de fato de ouro no caso de uma Olimpíada. Sim, porque o Brasil ganhava ouro em handebol e todas as potências do handebol estão na Europa, caso de Suécia, França, Rússia, Hungria etc. O Brasil ganhava ouro em atletismo, sei lá, 100m rasos, e, ao comparar o tempo do medalhista com os tempos dos atletas top, o cara não teria nem se classificado para a final olímpica. E por aí vai.
O pan deveria servir de laboratório para o País, assim como fazem os Estados Unidos, que mandam seus atletas universitários para que eles ganhem tarimba em competições internacionais. Ainda assim, os caras ganham quase tudo. Afinal, qual é o sentido do Cielo nadar contra esses caras que estão lá (sem querer desmerecer ninguém)? Ele vai ganhar com o pé nas costas, vai ser ridículo. Seria o mesmo que a Argentina mandar o Delpo para participar do torneio de tênis, os Estados Unidos mandarem os astros do basquete, a Jamaica mandar o Usain Bolt e o Asafa Powell. Pra quê?
Mas por que o Brasil não faz isso? Porque assim a imprensa ufanista pode fazer o maior estardalhaço, os torcedores trouxas ficam com a ilusão de que somos uma potência e todas as merdas que são feitas com o dinheiro que deveria ir para o desenvolvimento do esporte ficam escondidas por trás das braçadas do Cielo e do Thiago Pereira, das cortadas das meninas e dos meninos do vôlei, etc., etc., etc.
É triste, mas é isso. O Brasil não faz um trabalho sério na educação, não faz na saúde, não faz nas obras de infraestrutura, mesmo arrecadando trilhões de reais em tributos (onde está o dinheiro?, o gato comeu, o gato comeu; e ninguém viu; o gato sumiu, o gato sumiu...) - por que faria esse trabalho com o esporte? É por isso que a Magic Paula não aguentou muito tempo quando o governo Lula a colocou num cargo importante para cuidar do esporte de alto rendimento. Porque não demorou nada (a Paula, além de ótima atleta, é muito inteligente) para ela perceber que estava sendo usada como garota-propaganda.
Pois é, o esporte brasileiro é uma alegoria perfeita da nossa situação em geral. As coisas boas acontecem muito mais por causa do esforço individual de alguns heróis do que por incentivo, através de um trabalho sério de massificação do esporte nacional. É claro, os políticos querem faturar amanhã, e não daqui a vinte anos. Como faturar rapidamente? Tentando usar pessoas como a Paula, condecorando atletas em cerimônias pomposas no Palácio do Planalto - porque isso é muito mais fácil do que realmente fazer um trabalho estrutural, sério e de longo prazo e ainda sobra grana para "sumir" por aí. Afinal, é caro dar reais condições para atletas ficarem competitivos. Vai ver quanto investem os Estados Unidos e quanto vem investindo a China, que em 2008 nadou de braçada e ficou em primeiro lugar com folga no quadro de medalhas.
Por que será que uma ilhota como Cuba tem muito mais tradição no esporte que o Brasil? Agora Cuba está em decadência, mas se olharmos para os últimos vinte, trinta anos, tenho certeza de que os cubanos ganharam muito mais medalhas de ouro que nós nas Olimpíadas. Muito mais. E é por isso que eu não queria falar do pan, porque eu não aguento mais essa maldita farsa.
Eu, que assisto até a campeonato de cuspe à distância e paro para ver os velhinhos de Santos jogarem dominó no "Último gole", me recuso a acompanhar o que quer que seja desse, ou de qualquer outro pan. Passarei ao largo.
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